Faltavam poucos dias. Acho que uns cinco ou seis. O suficiente para nos animar mais ainda.
Primeiro Natal com neve.
Pena que não foi assim. Nem tudo foi do jeito que a gente planejou naquela viagem. A começar pelo dinheiro.
- Leva mil dólares, dá fácil para um mês lá. Aí você arranja um emprego - fácil também - e começa a se manter.
Até parece. Mas estávamos indo. Cada um dando seu jeito, apertando onde podia, deixando de beber uma ou outra cervejinha no fim da tarde, depois de bater perna o dia todo atrás de oportunidades. Àquele momento, tudo já estava encaminhado. Alguns ainda não tinham recebido o primeiro salário, outros nem haviam começado, mas era questão de tempo.
Ali, no mercado, iam-se embora mais alguns pares de dólar. Tudo bem, estava todo mundo sonhando com aquele momento. Parecia um milagre que tudo tinha dado certo, no fim das contas. A casa estava alugada (era para seis, moravam 12), a cerveja já estava na geladeira (curiosamente, no posto era mais barato) e até a lareira tinha sido acesa horas antes (coisa de brasileiro). Faltava só pagar a conta.
Dividindo por seis, deu pouco mais de 10 paus pra cada. Nada, nada, era uma grana pra gente. Mas tinha ir. Um a um, jogamos as notas e moeda no caixa, enquanto a moça simpática ia contando tudo.
- Faltam 12 dólares. Sorriu.
- Calma, gente, acho que tenho aqui, tô contando minha parte.
Lorena já se desesperou, falando em português com a atendente que fez cara de paisagem. Faltava só ela pagar.
A senhora atrás olhava curiosa. Esbocei um "I'm sorry". Pavor de achar que estou sempre atrapalhando. De moedinha em moedinha, Lorena conseguiu. Juntou com suor os 12 dólares e entregou para a moça que ainda mantinha o sorriso. A senhora continuava olhando.
Na porta da saída, Lorena quase chorou. Tava difícil, não era praquilo que tínhamos viajado tão longe. Todo mundo se abraçou. Era brega, mas era só a gente. Ela resolveu ligar para casa, a saudade bate mais forte nessas horas.
Papo vai, papo vem, a gente sentado brincando com a neve que estava no chão, esperando. De frente ao telefone público dava pra ver a senhora que estava atrás na fila vindo em nossa direção. Xiiii, lá vem bronca.
Ela passa pela gente sem falar nada, mas vira para Lorena. Ignora que ela está com o fone em uma das mãos e segura na outra. Aperta com força, diz alguma coisa que ninguém consegue entender. Do outro lado da linha a mãe grita mais alto, achando que a ligação caiu. A filha, ainda atônita, com uma nota de cinquenta dólares na mão só consegue responder, enquanto os flocos brancos começam a cair novamente:
- Acabei de ter um milagre de Natal.